sábado, 30 de janeiro de 2016

Despoesia

Resolvi olhar do que eu sofria


Sofro de
  • necessidade de sofrimento para criar soluções para os sofrimentos
  • falta de criação quando sem sofrimento
  • excessiva densidade de intensidade de mim mesma
  • falta de compaixão com a superfície das coisas
  • análise compulsiva
  • choro por excesso de beleza
  • piada por excesso de tristeza
  • excessiva seriedade em ideais
  • ideais exessivamente elevados
  • excesso de vontade de beijar músicas
  • impossibilidade de ser uma música (não musicista) e me juntar às outras músicas
  • procastinação
  • falta de uma paixão humana para levar no bolso e olhar no ônibus, no mercado e no teto
  • falta de esperaça em paixões humanas
  • excesso de medo por paixões humanas
  • excesso de força irresoluta
  • saudades de certezas
  • irreconhecimento de auto-merecimentos
  • atração inútil por vestidos, perfumes e flores em vasos
  • rebeldia em frente ao Universo
  • rebeldia em frente às poesias
  • dúvidas do momento presente
Talvez eu esteja grávida de uma nova forma de viver. Vamos aguardar os resultados.



quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

2016

As minha reais resoluções de 2016




Oi, blog, quanto tempo! Tava com sdds...

Enfim, nem sei por onde começar... ontem eu tive uma penca imensa de revelações, as quais minha mãe ajudou a catalisar ao me dar um sermão, por incrível que pareça. Eu vou começar dizendo que não vou mais me sentir culpada, que não vou mais me freiar por causa dos privilégios que tenho.

Durante os últimos 3, 4 anos, eu comecei a me sentir muito mal por ter privilégios que outras pessoas não tem: família estruturada, casa, conforto, oportunidade de ir pra faculdade, de estudar, de me vestir bem... uma infinidade de coisa que não contemplam, infelizmente, grande parte da população do Brasil (e de quebra do mundo).

Pois é, mas eu não vou mais provocar esse desconforto propósital em mim, e desejar que eu não tivesse esses privilégios para que o mundo fosse mais justo. Vei, na boa, não vou cortar fora minhas pernas por que tem gente que não tem pernas. Sequer existe um "balanço geral" de justiça no mundo. É a vida - se eu puder correr por aí e subir numa árvore com minhas pernas, posso buscar uma goiaba pra quem não pode com as próprias pernas.

"ah, mas esquerda caviar"

deixa de ser ruim, deixa os outros crescerem de onde estão, e não do zero, oh inimigo imaginário de moral auto distruidora. INIMIGO. Não manda em mim >:(

É essa questão moral... se vc pode matar uma pessoa pra salvar 4, ou vc pode matar as 5 e não ter que se decidir, vc vai matar todo mundo pra ser mais justo? Anjos se curvarão diante da sua justiça, oh grande sabedoria.

Pois é, o mundo posse ser injusto. E para melhor (eita, que grande revelação! Nunca tinha pensado nessas palavras)

Isso, evidentemente, não exclui que eu continue a ficar do lados dos oprimidos. Na verdade, não muda quase nada, só tira o peso da minha consciência =p


Aliás, hei de requerir outros privilégios que abri mão. Um deles é ficar em paz, e não espalhar a discórdia onde já está caótico.

Eu já sei quem vai ouvir o que tenho a dizer, minhas opiniões, e quem não. E grande parte das pessoas não está disposta a abrir mão de suas convicções nem por empatia, nem por lógica. Eu não devo brigar com elas, pelo contrário. Vou trabalhar meu psicológico para que eu possa espalhar a minha (futura) paz interior ao meu redor. Alguém foi ruim comigo? Pois vá em paz; que o amor do Universo acalme a ignorância do seu coração.

"Ah, mas foi criada numa família estruturada, claro que essa paz é um privilégio, não tenho obrigação de ficar na paz"

Eu não tenho obrigação de sair dessa paz, mas eu acredito, de fato, que o exemplo é o único professor confiável nesse mundo barulhento. Pois é, de novo a história das pernas que eu tenho.


...


Parece desnecessário todas essas resoluções, mas eu li tantos textos que me deixaram me sentindo mal por ter coisas que os outros não tem... Mas meu sofrimento proposital NÃO É ÚTIL, pelo contrário, vai compactuar com a disseminação de raiva pelo mundo. E se não é legal ver polícia com raiva, pode crer que também não é legal ver não polícia com raiva. Sei lá, cidadões, se vcs quiserem fazer de mim uma inimiga, tbm, vou ter que aceitar "/

Falando em compactuar, eu sinto muito, mas vou ter que aceitar que eu estou num sistema social e compactuar com ele para que nós dois saiamos ganhando. Quem nem as pernas, sabe? Eu tenho duas pernas por motivos incompreensíveis e transcendentais de que a minha consciência está atachada a um corpo humano, que costuma ter duas pernas. Bem, eu poderia me rebelar contra esse sistema fisiológico e, em vez de me locomover como uma humana bípede normal, saír por aí rolando deitada. Eternamente. Mas, por favor, EU NÃO QUERO!

Eu acho maneiro estudar, me envolver com coisas produtivas e tal. Inclusive, eu me sinto mal se eu to vivendo sem um objetivo futuro, onde o presente esteja lá como um caminho a se construir. Pois é, vou utilizar essas pernas pra correr e, mais precisamente, correr avante.

Pois é, tem algumas pessoas que afirmam que devemos curtir mais a vida. Mas curtir a vida, pra mim, não é só entreterimento efêmero e sem objetivo. Nunca foi, sempre curtir correr atrás de algo. O que me faz lembrar...

Tenho que parar de acreditar que os outros estão sempre certos e eu sou uma completa louca sem-noção que não sabe de nada.

Não. Inclusive, muito pelo contrário, no que condiz ao o que eu quero, só eu posso dizer o que é bom pra mim. Experienciar a vida em festas e todas essas coisas, só de vez em quando. Nem curto. Tem gente que me diz que um dia eu vou aprender a gostar, pois até agora já se passaram anos e até hoje, a única coisa desse universo que me agrade é beber vinho =p Podem ficar com essa história de festa, drogas, bebida, pegar geral... sério, não quero.

"ah, mas sua careta"

Quando eu era pequena eu chorava vendo Video Cassetadas do Faustão. Eu não me sinto bem até hoje vendo acidentes alheios. Respeita meu conforto, porra!


Mudando de tópico: auto-confiança. Eventualmente, eu vou escrever pq que auto-confiança é benéfica não somente a quem a tem, mas como tbm às pessoas ao redor de quem tem. Ela está onde o ego não está. Eu quero sair do meu ego e viver onde estiver essa auto-confiança. Nos últimos tempos eu tenho me doido muito com essa falta de fé em mim mesma. Pretendo mudar isso.


Outro tópico: amor romântico. Diferente de todo o resto do universo, onde o foco no objetivo e a luta lhe resultarão a vitória, amor é uma experiência: você o vive, e talvez quem vc ame tbm o vivêncie por vc, mas talvez não. Nem todo mundo tá preparado pra ver o amor nas pessoas. Diria até que o amor é perceber que o outro existe. Aliás, isso dificulta um pouco essa área do amor romântico pra mim, pq esse é um amor que se diferencia do amor desinteressado, pq vem acompanhado de atração física. Ou não. Eu confundo tudo, às vezes só amo, sem saber q amor é...

O importante, pra mim, é evitar paixões platônicas. Eu coloco muita energia, muito tempo em cima delas e costumo me machucar. Teoricamente, é só não se apaixonar pela pessoa recriada na imaginação, que é parecida com a pessoa do mundo real, mas não a é. Ou seja, não se deve criar expectativas, mas sim se apaixonar na realidade, com a vivência do outro. Ainda assim, se eu me machucar, bem, pelo meno eu tentei uma nova abordagem, acho que dessa vez vai dar certo... lembrar que o amor é esse fluxo de energia entre as pessoas...


Última coisa: divertir-se estudando. É possivel, claro -era legal na escola =3


Pronto. Depois de várias reticêncas, me dei por satisfeita. Essas são minhas resoluções.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Tremendouro



Algo ruim aconteceu
Para a Desgraça geral da Nação
inimporta real, falso ou virtual
o desejo é de alambrar as carroças
e plantar velhas palmeiras
com folhas debaixo da roça

Tridentes já são demodé
Quando peçonhas são derramadas em flores,
novelas e bolos
Um pedaço aqui, p'ra você

"não(,) obrigada"

Então se prepara, que irá desconhecer
as velhas calmas feras
"Como é um tapete por baixo"
agora tu vê

Entropia é natural, me vêm,
catalisa sistemas em desajuste
e a ira e a derrota também
Não há nada a se esclarecer

E a inteligência, não ordena?
Qual é sua cadeira,
se temos dois, três, quatro
mil carrascos
a vontade acima do dever
e do bem querer.



terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Mais um encontro de pensamentos

me encarando


Acredito que eu sempre tenha sido mais complacente com as faltas alheias do que com as minhas próprias, que isso sempre esteve em mim. Mas, mesmo assim, os ensinamentos da vida vem me trazendo mais tolerância com os erros dos outros, com o jeito de ser, com as escolhas e fraquezas. Tenho amigos que lutam para que todos sejam aceitos, e isso tem me influenciado. Além disso, o pouco que já li e vivenciei sobre psicologia também tem me feito mais aberta com as condições, antes talvez irritantes, dos outros. Entretanto, nisso tudo há um problema: eu tenho levado essa paciência a minha própria pessoa.

Entre se aceitar e cultivar seus próprios defeitos e inabilidades tem um invisível, gradativo feixe e perigoso. Eis como me sinto:

Sinto que comecei a observar minha personalidade, desejos, necessidades e interações como um mundo a ser explorado passivamente. Tenho visto-me como um ambiente de observação, sobre o qual eu não devo interagir para não perder minha liberdade. Acredito, também, que somos influenciados pela sociedade a agir de tais e tais modos, então tenho tentado combater as vontades que me parecem de fora, que servem para me adequar ao sistema. Mas pra falar a verdade, tenho falhado nesse último ponto, e não obstante creio que tudo isso tem me atrapalhado a avançar como ser humano.

Tenho ouvido muito meu corpo falar, e adivinha, tenho ouvido "preguiça" muito frequentemente dele. Preguiça, comida, sono, caminhar, sol, deitar. Algo interessante que notei é que eu tenho vontade de comer frutas e outras coisas saudáveis mais do que de comer frituras, e que rapidamente doces me enjoam. Mas também notei que se meu corpo fosse eu (é ou não é?) ele passaria 99% do tempo deitado ou sentado, sem fazer nada. Claro, as vezes dá mesmo uma vontade de caminhar, mas não é muito frequente.

Outra questão, é que tenho tentado ser mais espontânea nas minhas relações sociais. Tenho tido bons resultados, exceto que eu não consigo fechar a boca para expressar minhas opiniões e sentimentos, o que nem sempre colabora. Algo que eu não conseguiria parar de respeitar é a minha vontade de estar só de tempos em tempos. Pessoas acabam me desgastando (de alguma forma, eu estou sempre insegura perto delas).

Mas existem prêmios que o sistema te dá (e o meu ego gosta) se você fizer o que ele quer. Falo dos estudos e trabalhos.

Tenho ouvido muito minhas vontades falarem "ah, nem...", um medinho de falhar insistir "não, não, não, não..." e isso tem me atrapalhado a, por exemplo, fazer trabalhos melhores, começar antes, me concentrar.

Isso era algo impensável para a Transnonsense adolescente, que colocava as vontades do ego no topo das prioridades e tinha um enorme força para se concentrar.

(ainda ouvirão muito eu falar de mim adolescente, minha maior inveja da vida)

Eu estou num mar de complacência para com as minhas fraquezas. Olho para minha insegurança e falo "poxa, tadinha de mim ter que ser confiançaneta... ah, se eu fosse mais confiante, tudo o que eu faria. Penas que não sou".

Outro lado de mim, o que vos fala, está em pânico! Tudo o que esse meu eu auto-piedoso vem fazendo está me afastando não apenas de mim, como dos meus sonhos. O que é isso que vem me levando para essa maré da mediocridade? Quanta vergonha que o resto da minha eu adolescente não sente?

Eu acredito que tenhamos todos que estabelecer objetivos, para alcançá-los. E quando tivermos medo, que aceitemo-os até desaparecerem, e não irmos tomar chá e fazê-lo objetos de estudo. A não ser que esse seja seu objetivo, estudar o medo.

domingo, 7 de dezembro de 2014

Secando pratos com caxemira



Sonhei com a liberdade
Até ela tomar forma
Se antes era camuflada de nuvem
Hoje virou abrir a boca na chuva

Ou brincar com um guindaste
Fingindo ser um pássaro na cidade

Mas tem a liberdade de dentro
Que como o vento,
Canta sem dizer uma só palavra

Esse é a liberdade que me causou
Uma implosão, um vácuo
E apagou as velas
que enfeitavam as lembranças

Liberdade me tornou um pêndulo
Sem relógio

Para onde vou agora
Quando só a mim pertenço
E minha casa nunca se vai embora?

Para que serve a liberdade
Se não para ser buscada com espada e sangue?
Ou para dizer que flores são órgãos reprodutores?

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Um conto sobre preguiça 3

A Batalha de Abertura


Algum daqueles mundos envenenados de personalidade se dividiu entre suas várias personificações. Surgiu, então, da savana azul, uma entidade chamada Funig. O ambiente, a savana, todo foi idealizado por Funig, ou talvez, se espelhou dela sem ter sido pensado. Era uma árida savana, azul pela pouco luz, seca de poucas tempestades, desvirtuosa de emoções. Funig era a entidade mestra, lá tudo era seu reflexo, e esta, por sua vez, era um reflexo de onde estava. 

Funig passava o dia sentada, esperando desaparecer.Desaparecer parecia melhor que existir, mas para isso seria necessária alguma dor desconhecida, e Funig temia-na. Diferenciar as estrelas parecia mais certo que desaparecer, e era isso que Funig fazia. A entidade passava as horas a arrastar galhos secos no chão, sendo conscientemente vã. O peso de existir fazia Funig espirar gases sórdidos de seu pulmão. Isso matava ainda mais aquela savana. Era uma vilã, segundo alguns, ainda que ela pedisse desculpas por sê-lo.
Algum dia, veio uma tempestade solar. Assoprou toda a poeira velha, e incandesceu os folhas secas. Surgiu Irgen. Irgen era incandescente, queimava o que tocava, feria quem estivesse ao seu redor, inspirava agressividade. Contudp, Irgen tinha enormes poderes. Além de iluminar aquela savana quando chegou, Irgen modificava a realidade. Ao longe, parecia que era o próprio espaço-tempo que vibrava ao redor da nova entidade, o tanto que seu calor parecia transformar o mundo ao seu redor.

Quando Irgen chegou, pôs suas mãos na terra e transformou tudo em fogo. E quando o fogo sessou, surgiu grama, surgiram flores, surgiram mesmo emoções coloridas do chão. Irgen, por onde estivesse, brilhava tanto que se fazia rainha. Enquanto estava lá, ela transformou aquela savana no exato jardim que jamais alguém acreditou que pudesse ser possível de se haver. Contudo, Irgen era tirana, e queimava tudo o que sai de seus planos -transformava as folhas caidas e as pedras quebradas em carvão.

Quando Irgen surgiu, Funig queimou no vão que se abriu em si mesma. Mas ela não deixou de existir. Funig está fadada à imortalidade, enquanto seu mundo existir. Entretanto, Irgen a ignorava. Irgen construiu um império sob seu total controle. E para controlá-lo, ela queimava tudo o que se atrevesse a desafiá-la. Ela se ocupava de criar todos seus caprichos por conta própria, e construí-los ou destruí-los segundo seus desejos.

De tanta força que Irgen usava, de tanto calor que ela liberava, naquele jardim não pousavam mais pássaros, a chuva evaporava antes de refrescar o chão, as flores secavam de calor. Irgen, rezavam os visitantes, era impiedosa e cruel.

Mas eventualmente, Irgen se cansou e adormeceu. Sentiu que transformar o mundo drenava-a.

Foi o momento em que Funig ressurgiu. Funig absorveu toda aquela energia, enquanto Irgen dormia. Funig virou uma enorme bolha de tanta energia que recolheu do ambiente, e este, por sua vez, começou a virar uma savana novamente.

Durante seu sono, choveu algumas emoções em Irgen. Ao despertar, Irgen viu que todo seu jardim se esvaziara de vida. E Irgen percebeu que havia uma responsável por isso.

-O que fizestes com meu jardim, ser perdido? -começou a se esquentar Irgen com Funig.
-Nada. Só tava ali. Tive medo de sair e perder tudo, então achei melhor engolir tudo antes de sumir.
-Isso não faz sentido! Como alguém pode engolir meus feitos? Devolva-os imediatamente!

Mas Irgen não sabe que Funig é incapaz de qualquer coisa, a não ser absorver e desenhar na areia. Não poderia devolver o  que ela havia absorvido. Funig, sentada, olhou para Irgen sem nada dizer.

-Se não me devolveres, tomo-lhe a força! -enfureceu-se Irgen. Sua fúria a fez brilhar. Seu brilho incandescente aumentou. Ela foi em direção a Funig e meteu a mão em seu coração. Funig era gelatinosa, enquanto Irgen era como fogo. Funig, sem nada fazer, apagou a mão de Irgen, que olhou assustada a sua impotência repentina.

-Estás a me desafiar? Ninguém me vence! -bradou Irgen. Funig a olhava indiferentemente. Irgen repetiu o golpe, porém nada mudava. Ela reacendia suas mãos a cada apagar, mas Funig também não sentia diferença.

No fundo, Funig achou que talvez fosse uma boa oportunidade de deixar de existir. Talvez o mundo devesse pertencer àquela figura forte, que por catástrofes transformava-o. Ela fechou os olhos e aguardou. A sua indiferença fez Irgen ainda mais brilhante. Socava-lhe o peito furiosa em vão. Em uma última tentativa, Irgen se jogou dentro da enorme figura de Funig. Sem ar, Irgen começou a desaparecer. Ela sentiu um enorme desespero, naqueli que parecia ser seus últimos instantes.

-Como, eu, senhora desse mundo, posso ser derrotada tão facilmente? Não, isso não é possível!


A savana escurecida, azulada, tinha, como único ponto de luz amarelada, Irgen dentro da enorme forma gelatinosa de Funig. A voz de comando de Irgen foi abafada, derrotada pela preguiça de resistir de Funig. Funig ainda tinha a esperança de não existir, dentro de si.

continua...





terça-feira, 18 de novembro de 2014

As Dúvidas

de uma mente sem lembrança, pode?


Em algum dia esquecível, mas fatídico, eu duvidei. Eu não sei depois o que aconteceu, mas sei que ainda duvido. Eu duvidei tanto que é meu moto-continuo. Tudo se apresenta para mim como um tufão, que impede que eu toque certezas me assoprando para o longe; me faz voar e enxergar dessignificados.

Dessignificados. Tudo se despe. Sobra algum fluido qualquer, que me lembra que, se o que eu duvido foi feito por uma pessoa, então foi feito por uma pessoa. Transmitimos ideias, criamos padrões, comunicamo-nos, damos valores, avaliamos -tudo duvido.

Contudo isso está tudo perdido na minha mente. Enquanto o mundo gira em valores aceitos, eu não os consigo tocar. Eu estou presa, num mundo onde o valor é uma fumaça, onde a a dúvida, ou experiência, é a moeda de troca que a minha mente me pede para continuar existindo. Graças aos céus, eu posso negociar com esta. Ainda sinto que meus abrigos estão nela. Meus abrigos, mas não eu.



-engraçado é que...

Um dia eu duvidei da mente. Ela quase deixou de existir (e não eu). E esse foi outro dia fatídico, talvez até inesquecível.

Todavia, a mente se regenera na dúvida, seu meio.

Para que eu ainda tivesse um pedaço de terra nesse caos que é o lado de fora, eu tive que me assemelhar a ele. Agora eu caço dúvidas.

-


É isso. Eu caço dúvida, pois, do contrário, eu não existo aqui fora. Eu seria apenas completa na minha desavaliação e dessignificância desmentidas. Por isso duvido tanto, e talvez me conheçam segundo minhas dúvidas.


(sem mente, talvez apenas ouvisse música e colhesse flores)